Saturday, March 24, 2007

"As palavras", de D. Angelina


As palavras
Podem ser ditas com amor e desamor
Com amizade e ternura
Mas quando ditas com rancor
São fel, sem amizade sem doçura


As palavras
Podem ser humor
Transmitem o que nos vai na alma
Paz, tranquilidade
Quando ditas com calma
Mas ditas com cinismo
Podem fomentar guerras
E até pôr a humanidade à beira do abismo

As palavras
Podem ser cristalinas
Belas e transparentes
Mas podem ser mordazes
Cheias de maldade

As palavras são capazes
Do melhor e do pior
Podem transmitir a morte
A tristeza o desgosto
Podem trazer felicidade
Transmitir a sorte
Anunciar a calamidade
Que nos leve ao desnorte

Uma palavra carinhosa
Pode nos trazer a paz interior
Paz de espírito e de alma
Pode ser um bálsamo
Uma coisa celestial
Mas ditas com rancor
Podem ser um punhal
Que se torne mortal
Ou trazer-nos a desdita

A palavra tem muita força
Depende por quem for dita.


(Poema escrito pela D. Angelina com base no poema homónimo de Eugénio de Andrade. O quadro intitula-se Cidade.)

"As palavras", de Eugénio de Andrade


As palavras
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.

Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?