Saturday, January 20, 2007

Garrett e Azambuja




O escritor Almeida Garrett, figura de proa do Romantismo português, não foi aluno da nossa escola. Mas tal não o inibiu de escrever sobre o pinhal de Azambuja no seu livro Viagens na Minha Terra. Estas impressões celebrizaram Azambuja na Literatura Portuguesa. Parece-nos que estas notas são um bom texto para iniciar o blogue.
.
"Aí está a Azambuja, pequena mas não triste povoação, com visíveis sinais de vida, asseadas e com ar de conforto as suas casas. É a primeira povoação que dá indício de estarmos nas férteis margens do Nilo português. [Cap. 2]
[...]
Este é que é o pinhal da Azambuja?Não pode ser.Esta, aquela antiga selva, temida quase religiosamente como um bosque druídico! E eu que, em pequeno, nunca ouvia contar história de Pedro de Mala-Artes que logo, em imaginação, lhe não pusesse a cena aqui perto!... Eu que esperava topar a cada passo com a cova do Capitão Roldão e da dama Leonarda!... Oh! que ainda me faltava perder mais esta ilusão...
[...]
Por quantas maldições e infernos adornam o estilo dum verdadeiro escritor romântico, digam-me, digam-me: onde estão os arvoredos fechados, os sítios medonhos desta espessura? Pois isto é possível, pois o pinhal da Azambuja é isto?... Eu que os trazia prontos e recortados para os colocar aqui todos os amáveis Salteadores de Schiller, e os elegantes facínoras de Auberge-des-Adrets, eu hei de perder os meus chefes d’obra! Que é perdê-los isto — não ter onde os pôr!Isto não pode ser! Uns poucos pinheiros raros e enfezados através dos quais se estão quase vendo as vinhas e olivedos circunstantes!... é o desapontamento mais chapado e solene que nunca tive na minha vida — uma verdadeira logração em boa e antiga frase portuguesa.E contudo aqui é que devia ser, aqui é que é, geográfica e topograficamente falando, o bem conhecido e confrontado sítio do pinhal da Azambuja.Passaria por aqui algum Orfeu que, pelos mágicos poderes de sua lira, levasse atrás de si as árvores deste antigo e clássico Mênalo dos salteadores lusitanos.Eu não sou muito difícil em admitir prodígios quando não sei explicar os fenômenos por outro modo. O pinhal da Azambuja mudou-se. Qual, de entre tantos Orfeus que a gente por aí vê e ouve, foi o que obrou a maravilha, isso é mais difícil de dizer. Eles são tantos, e cantam todos tão bem! Quem sabe? Juntar-se-iam, fariam uma companhia por ações, e negociariam um empréstimo harmônico com que facilmente se obraria então o milagre. É como hoje se faz tudo; é como se passou o tesouro para o banco, o banco para as companhias de confiança... por que se não faria o mesmo com o pinhal da Azambuja?
[Cap. 5]"

No comments: